Carta enviada aos vereadores de Porto Alegre

                                 Porto Alegre, 03 de julho de 2014.

                  
                         Prezado (a) representante do Legislativo Municipal:

A Fundação Gaia – Legado Lutzenberger dirige-se à sua pessoa, representante dos cidadãos portoalegrenses, certa de que seu trabalho como vereador (a) está voltado principalmente para o bem-estar e o interesse da população.  Inspirados nos princípios e ações de nosso fundador, o ecologista portoalegranse José Lutzenberger, levamos ao seu conhecimento informações qualificadas sobre o PLE 57/13, a ser votado nesta casa na próxima segunda-feira, dia 07 de julho.

Segue abaixo uma análise do referido projeto feito pelo professor especialista no assunto Alvaro Augusto A. de Salles. Pedimos que atentem aos seus comentários sobre cada artigo que foram escritos no final de maio de 2014, apontando graves equívocos no PLE.

Ressaltamos a todos(as) que segue em vigor na Suíça a lei na qual foi baseada a pioneira Lei das Antenas de Porto Alegre, aprovada por esta casa em 2002. A Suíça, caracterizada pela sua pontualidade e cidadania, tem um exacerbado zelo pelo seu país e pelos seus cidadãos, com uma preocupação ainda maior com as suas leis, que são precisas e atuais.

Pedimos a cada um e a cada uma que referencie a lei construída nesta casa com tanto empenho por seus colegas e pela população, defendendo e dando a devida atenção à Lei 8896/2002, que “Dispõe sobre a instalação de estações rádio bases e equipamentos afins de rádio, televisão, telefonia e telecomunicações em geral no Município de Porto Alegre e dá outras providências.”

Certos de contarmos com seu trabalho em prol do bem comum e dos cidadãos de Porto Alegre, que certamente será lembrado na hora em que cada cidadão colocar seu voto nas urnas,

Cordialmente,

Lara Lutzenberger

Presidente da Fundação Gaia

 

Considerações sobre o PLE 57/2013 feitas pelo professor Salles

Neste texto estão feitas algumas considerações sobre o PLE 57/2013 em análise na Câmara Municipal de P. Alegre. São mencionados alguns equívocos, indefinições e incoerências do projeto na sua forma atual.

1.) Na “Exposição de motivos”

 “....  (a) os serviços possam ser disponibilizados com a máxima segurança para os munícipes ....”  

Isto é um equívoco ou uma incoerência ? (ver adiante)

“......Também nessa linha, a atualização proposta, impõe às operadoras de telefonia móvel, a obrigatoriedade de orientação ao usuário desses serviços, de recomendação sobre o uso de aparelhos celulares, como medida orientadora acerca das emissões das radiações emitidas e sobre as precauções necessárias à sua correta utilização, buscando a melhoria do atendimento público com a devida transparência. ......”

Isto aparentemente deveria estar incluído no Anexo III, que até a data de 19 de maio de 2014 não havia sido disponibilizado. P. ex., foi solicitado pela Cosmam em sua reunião de 8/4/2014. A CCJ ao aprovar este PL tinha ou não conhecimento deste Anexo III ? Caso negativo, como poderia aprovar o PL sem ter conhecimento de seu inteiro teor e conteúdo ?

2.) No Art. 

Art. 1º Dá nova redação ao § 1º e inclui inc. IV ao § 3ºdo  art. 1º da Lei nº 8.896, de 26 de abril de 2002, conforme segue:

§1º.  Para fins desta lei adotam-se as seguintes definições:

d) Torre de Telecomunicação –   estrutura vertical com altura superior a 20 metros

 

Observe que no Art. 2º , §3º adiante esta mencionado:

 .... § 3º Por restrição de acesso, fica vedada a instalação de ERB em forma de torre em terrenos e edificações de creches, pré-escola, estabelecimentos de ensino fundamental e médio, hospitais, clínicas e instituições de longa permanência de idosos.

c) Estação Rádio Base Móvel (ERB Móvel) é a ERB destinada a cobrir demandas específicas com permanência máxima de 90 dias.

ERBs móveis por períodos restritos poderiam ser utilizadas durante a copa sem necessitar alterar a Lei 8896 de 2002 ? Bastaria uma autorização provisória ? Aparentemente a Prefeitura ja assinou um acordo com operadoras, para instalação de 12 antenas em estruturas de iluminação pública próximas ao estadio Beira Rio ?

 f) Femtocell: são pequenas estações rádio base (ERBs) desenvolvidas para operar dentro de residências. Operam em baixa potência nas freqüências utilizadas pelas operadoras de celular

O que significa ... baixa potencia ? 1 W ? 10 W ? Limitação indefinida ?

V - A ERB em área construída equivale a área não adensável para fins Lei Complementar 434/99, atualizada pela Lei Complementar 646/10.

Este item PARECE QUE DESCARACTERIZARÁ a Lei 434/99 que caracteriza a ERB como um tipo de instalação adensável isto é que deve ser somada à área efetiva da edificação.

Segundo a Lei 434/99 a ERB é uma estrutura relacionada à área ADENSAVEL pois não é destinada a atividades complementares às atividades principais e as destinadas aos serviços gerais e de apoio a edificação. Portanto devem ser incluídas no computo do índice de aproveitamento das áreas construídas.

Assim talvez considerando a ERB como “não adensável”, poderiam ser resolvidas várias situações de instalações de ERBs que hoje estão ilegalmente instaladas ?

3.) No Art. 

Art. 2º Dá nova redação aos incs. I e II e aos §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 7º do art. 3º da Lei nº 8.896, de 2002, conforme segue:

II – na implantação de ERBs deverá ser observada a distância mínima de 5m (cinco metros) de cada lado do terreno, salvo no caso de a metragem ser inferior a10 m (dez metros), hipótese em que a implantação da ERBs deverá ficar centralizada.

Ou seja, se a metragem do terreno for p. ex., de apenas 2 metros, basta ficar no centro, p. ex., 1 metro de cada lado ? Limitação inexistente ?

§ 3º Por restrição de acesso, fica vedada a instalação de ERB em forma de torre em terrenos e edificações de creches, pré-escola, estabelecimentos de ensino fundamental e médio, hospitais, clínicas e instituições de longa permanência de idosos.

Então se for uma estrutura com menos de 20 metros de altura pode colocar em terrenos e edificações de creches, pré-escola, estabelecimentos de ensino fundamental e médio, hospitais, clínicas e instituições de longa permanência de idosos ? Liberou geral ?

§ 5º As avaliações referentes aos limites de exposição humana a campos eletromagnéticos a que se refere o inciso I do “caput” deste artigo devem conter, no mínimo, as seguintes informações:

d) medições realizadas em diferentes dias e horários, de forma a garantir que os horários de maior tráfego telefônico da ERB sejam considerados, no caso da impossibilidade de garantir que todos os canais estejam simultaneamente acionados;

Como “........no caso da impossibilidade de garantir que todos os canais estejam simultaneamente acionados” ... ?

Isto representa novamente liberação geral. Sempre é possível garantir que todos os canais estejam simultaneamente acionados, e em sua potência máxima. Basta querer, e é nesta situação que as medidas devem ser efetuadas.

 Ver também o item a) deste mesmo § 5º:

§ 5º As avaliações referentes aos limites de exposição humana a campos eletromagnéticos a que se refere o inciso I do “caput” deste artigo devem conter, no mínimo, as seguintes informações:

a)      as características da ERB e a potência efetiva isotropicamente irradiada (EIRP) considerando todos os canais instalados em plena operação, em dBm (decibel ref. miliwatt);

Aí ocorre outra indefinição: “plena operação” não implica que estejam em emitindo em sua potencia máxima. Dependendo da “cobertura” desejada (e em alguns casos também da ocupação), a potência pode ser aumentada ou reduzida instantaneamente pelo operador do sistema (ou mesmo automaticamente, em alguns casos)

e) levantamento dos níveis de campo eletromagnético nos limites da propriedade da instalação, em edificações vizinhas de altura similar ou superior aos pontos de localização das antenas de transmissão e recepção nos locais sensíveis e críticos.

Outra incoerência a meu ver. As medidas devem ser efetuadas em quaisquer locais onde possam haver pessoas. Mesmo porque, as antenas emitem mais energia em um ângulo ligeiramente inclinado (“tilt”, para baixo) em relação à horizontal.

4.) No Art. 

 Art. 3º  Dá nova redação ao caput e aos §§ 1º, 2º e 3º do art. 4º da Lei nº 8.896, de 2002, conforme segue:

Art. 4º  As medidas de campos eletromagnéticos nos locais críticos deverão ser realizadas pelas operadoras de telefonia móvel a cada período de seis meses a contar do licenciamento municipal e pelo Município, por meio da SMAM, a qualquer tempo.

Aí ocorre a meu ver outro equívoco:

Porque as medidas deverão ser realizadas pelas operadoras de telefonia móvel e em qualquer tempo ? Se o espírito da lei seria fiscalizar, como atribuir a operadora este poder ? E ainda mais,  ..”a qualquer tempo”.... ? Por exemplo, esta medida poderia ser feita com a ERB com baixa ocupação (ainda que estivesse “em pleno funcionamento”) ?

 5.) No Art. 10º

Art. 10.   Dá nova redação art. 11 da Lei nº 8.896, de 2002, conforme segue:

“Art 11. As operadoras de Telefonia Celular ficam obrigadas a confeccionar e a distribuir, no ato da venda, material explicativo contendo informações acerca das radiações emitidas pelos aparelhos celulares e sobre as precauções necessárias à sua correta utilização.

§ 1º O material explicativo, deverá conter, no mínimo, o constante no Anexo III desta Lei.

Este Anexo III somente foi disponibilizado no dia 19/5/2013. Não foi p. ex. disponível quando a COSMAN analisou este PL em sua reunião em 8/4/2014. Aparentemente não foi também considerado na aprovação deste PL pela CCJ. Como pode a CCJ aprovar o PL sem conhecimento de seu inteiro teor e conteúdo ?

Alem do mais, este anexo aparentemente é idêntico ao anexo ao Decreto Municipal No. 15.541 de 17/4/2007, e que foi publicado no diário oficial em 24/4/2007, pag. 2, como pode ser visto no arquivo que estou anexando: DECRETO celular Nº 15.541, de 17 de abril de 2007.pdf

Aparentemente este Decreto não esta sendo cumprido, e a fiscalização disto é deficiente. A este respeito, a Agapan oficiou ao Procon Municipal em carta datada de 11/10/2012, sem ate o momento ter tido resposta (ver em anexo: PROCON Agapan Decreto 15541.pdf).

Caberia então a pergunta: de que adianta isto estar previsto na legislação, se não existe cumprimento disto ?

Acredito que estas questões apresentadas deveriam ser consideradas pelo Executivo Municipal, e que este PLE 57/13 deveria ser aperfeiçoado visando melhor atender os interesses e as necessidades de proteção a saúde a ao ambiente nesta cidade.  

Sempre é importante lembrar que a OMS- Organização Mundial da Saúde classificou em maio de 2011 estas radiações como "possivelmente cancerígenas" (Grupo 2B), e simultaneamente recomendou a redução sempre que possível da exposição a estas radiações.

Estarei a disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais que sejam necessários.

Na certeza que estes comentários e sugestões tenham a devida consideração, e

Cordialmente,

Alvaro Augusto A. de Salles

Professor Associado, Depto. de Eng. Elétrica, UFRGS

e-mail: aasalles@ufrgs.br